A ação docente em classes multisseriadas, em pequenos povoados localizados no meio rural, possui toda uma especificidade. E, por mais que historicamente esta modalidade de educação tem sido legada a segundo ou terceiro plano, para não dizer que fica esquecida, em um completo silenciamento, com a valorização do urbano, alguns vaticinam, inclusive o seu fim.
Em detrimento a isso, porém, enquanto houver pequenos povoados, de difícil acesso e com poucas crianças em cada faixa etária, a multisseriação e a unidocência se faz necessárias. O que deve ser defendido e reivindicado fortemente é valorização desta modalidade de ensino e dos docentes que aí atuam.
A educação desenvolvida em classes multisseriadas em povoados do meio rural brasileiro e, principalmente nordestino, não pode ser concebido como algo menor, sem importância. Mas, precisa ser valorizado como qualquer outra modalidade de educação escolarizada. Os sujeitos da roça, que trabalham no meio rural, também precisam usufruir dos conhecimentos produzidos e sistematizados ao longo da história da humanidade, que sejam científicos, técnicos e culturais.
Entretanto, esses conhecimentos não devem seguir a mesma metodologia, os mesmos recursos e os mesmos livros didáticos que são elaborados para o uso de estudantes urbanos, por mais que os avanços tecnológicos através das mídias tentam homogeneizar tudo. Os sujeitos que vivem no meio rural, tem suas especificidades, valores éticos e culturais diferentes dos produzidos no meio urbano. E, isso precisa ser levado em consideração ao se implementar uma proposta pedagógica.
Neste sentido, a construção do conhecimento fundada em uma epistemologia da terra - construção de conhecimentos com base axiológica no cultivo da terra - passa necessariamente pela valorização docente. Muitas vezes, os docentes que atuam em classes multisseriadas no espaço rural são relegados a um descaso tão grande, que não conseguem ter consciência da importância das suas ações em tais espaços.
Assim, a necessidade de fazer ouvir essas vozes a partir das narrativas de vida, ao mesmo tempo que as vozes de outros sujeitos também se fazem ouvir possibilitam a tessitura de saberes e conhecimentos que fortaleçam, validam e valorizam o que é próprio da cultura local, que está intimamente relacionado com o cultivo da terra, as relações os fenômenos naturais e as relações humanas ai estabelecidas ainda baseadas na confiança e no respeito ao outro.
Os relatos orais de docentes das classes multisseriadas, desde de questões relacionadas ao que os constituíram docentes, as suas práticas em escolas rurais e as relações com o poder público estabelecido, a realização de encontros com o coletivo de professores para o estabelecimento de diálogos sobre as suas vivências e experiências em oficinas de criação de narrativas orais dialogadas, possibilita a construção de conhecimentos científicos, que irão contribui para todos que têm similitudes com estas, bem como favorece a formação e emancipação humana dos sujeitos diretamente envolvidos nessas oficinas.